10 de decembro de 2024
Moll Flanders
Daniel Defoe
Moll Flanders (1722)
Daniel Defoe é conhecido como o autor de Robinson Crusoe, livro que li duas ou três vezes durante a minha adolescência, cujo número de traduções, segundo a lenda, só é ultrapassado pela Bíblia. Mas é Moll Flanders que se considera como a sua obra-prima. É uma história picaresca de uma mulher, desde a sua juventude como protegida de uma família abastada, até à sua velhice, onde alcança por fim a prosperidade. Narrada na primeira pessoa, passa pela sucessão dos seus relacionamentos e casamentos, dos altos e baixos emocionais e financeiros, de como fez do furto a sua profissão durante longos anos, quando a beleza física já não lhe garantia a subsistência, até ser detida na prisão de Newgate, julgada e condenada à morte aos 60 anos. O arrependimento, e um indulto quase sobre a hora da execução, transformam a pena num desterro, materializado no regresso à Virgínia (para onde tinha ido anteriormente num dos seus casamentos, antes de descobrir que tinha desposado o próprio irmão), acompanhada por outro dos maridos, também ele um assaltante, igualmente desterrado, com o qual se tinha casado muitos anos antes em circunstâncias rocambolescas. E é nas províncias americanas que Moll Flanders encontra por fim a paz e a abundância que antes tinha almejado. Com um certo tom moralista, para atenuar os muitos desmandos que se descrevem, Moll Flanders é um esboço espontâneo e divertido de uma certa Inglaterra, no século XVII.
A camarada que ela me indicou tinha três tipos de especialidade, a saber: o roubo de lojas, carteiras e relógios de ouro das mulheres. Ela exercia este tão perfeitamente que nunca mulher alguma chegou a tanta perfeição nesta arte como ela. A primeira e a última destas ocupações me agradavam. Auxiliei-a por algum tempo na sua prática, como se fosse a assistente de uma parteira, sem nenhum salário.
Finalmente, ela me pôs a praticar. Exibira-me sua arte e, por diversas vezes, eu havia desenganchado, com grande destreza, um relógio de sua própria cintura. Finalmente, ela me mostrou uma vítima, uma jovem mulher grávida, que levava um relógio encantador. A coisa devia ser feita à saída da igreja. Ela caminhou ao lado da senhora e, exatamente em frente à escadaria, fingiu cair, e deu-lhe um encontrão com tal violência que a assustou, começando ambas a dar gritos terríveis. No momento em que ela atropelava a senhora, eu pegava o relógio, e, segurando-o da maneira planejada, o choque fê-lo abrir o fecho, sem que a dama o sentisse. Fui embora imediatamente e deixei a minha mestra recuperar-se lentamente do seu fingido medo, junto com a mulher. Percebeu-se, então, que o relógio tinha desaparecido.
— Ah! — disse minha companheira — foram esses velhacos que me fizeram cair, eu lhe garanto. Pena que a senhora não tenha visto antes o desaparecimento do seu relógio, pois podíamos segurá-los.
Ela fez valer tão bem esta explicação que ninguém suspeitou. Cheguei em casa uma hora antes dela. Foi a minha primeira aventura acompanhada. O relógio era muito bonito, na verdade; tinha muitas pedras. Minha protetora deu-nos vinte libras por ele, das quais me coube a metade. E assim eu me tornei um perfeita ladra, extremamente endurecida, sem nenhuma consciência ou pudor, num grau que eu jamais acreditaria possível em mim, devo reconhecê-lo.
Li anteriormente:
Robinson Crusoe (1719)
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